terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Dead Man Wake

Já de manhã, sonhou que chegava na casa do topo do morro. Abria os olhos e as portas; as janelas iluminando o cheiro de café e de fumo fresco.

Entrava pela porta e se sentava. Os móveis estavam lá ainda, só que cobertos com poeira. O pó fazia-os diferentes, a velha espingarda que pertenceu a seu bisavô pendurada por num prego por detrás da porta. Foi com ela que ele exterminou boa parte dos bichos das redondezas e, por fim, sentado no alpendre, arrebentou seu olho e metade da sua cara, que foi pousar no pó do pátio das galinhas.

Um café iria bem. Uma bebida pra quem volta de viagem. Sentia-o fresco, recém feito pela mulher. Na última olhada, uma aranha vivia dentro do bule, meio torto.

Um café. E depois partir.

Lá fora, sabia que o esperavam.

Primeiro via um, se mexendo nos matos. Depois o outro; o cano brilhante refletindo o sol. Sabia que dois jamais andavam juntos, então é certo que o terceiro estava lá também, na visão que ele tinha do nenhum.

Seu velho revólver na mesa suspirou; a conta da chance nas balas. Três. Acertaria um, com sorte dois, três jamais. Todo o acontecer levaria alguns segundos mas os corpos teriam que esperar o sol fugir pra poderem esfriar.

Olhava o chão; a mesma velha madeira de sempre, gasta dos passos e das patas do cachorro que um dia andou por ali em torno da mesa dos donos. A cama onde a mulher tivera seus filhos (todos eles, ou só alguns?) parecia também suspirar; o som dos rangidos ainda ali, escondido nas entranhas de madeira velha, esperando se manifestar quando alguém ali se sentasse.

Meio dia seria a hora de alimentar o gado, geografia raquítica que podia ser consultada nas costelas à mostra na luz filtrada da única árvore-sombra em quilômetros. Só um pouco de comida, o suficiente para viver mais um dia, até o meio dia seguinte.

Dava para sentir a inquietação dos três lá fora. Já nem faziam questão de parecer só um. Melhor terminar o assunto logo, pra poder ir descansar na sombra de um prostíbulo qualquer, gado-mandado-feito-homem.

Tirava o chapéu, colocava a arma sobre a mesa, tamborilava os dedos.

Suspiro.

Encostou a cabeça, de leve na mesa. O pó da viagem sempre tem efeito de sono sobre a cabeça.

Só mais um tanto, já resolvemos o negócio.

No canto, o velho relógio cheio tempo-parado, nem se dá o trabalho de soar.

Uma réstia de sol batia em sua testa.

Fechou os olhos.

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