segunda-feira, 19 de julho de 2010

Ouro

Uma bola presa, no telhado. Vermelha, quase furada. As crianças na parte de baixo, gritando em alvoroço. Acenavam pra ele, na janela.

Tio, pega pra gente.

Coisa de abrir a veneziana, dar dois passos, desprender a bola da calha.

Folhas na calha. Folhas mortas, água parada. Bola suja. Impossível limpar aquilo tudo.

As telhas fazem ruído estranho quando pisa. Envergam. Madeira podre.

Se abaixa pra pegar a bola, dá uma espiada pra baixo.

Cara, não faz isso. Não faz isso!

O sujeito era gordo. Óculos escuros, partido por um soco. Relógio de ouro, dente de ouro, corrente de ouro. Jesus, sofrendo em uma cruz.

Eu posso sei lá...mudar! Eu desapareço, sumo pra sempre!

Ouro. Havia uma regra de ouro, sempre houve.

O corpo caiu no chão. A bola saindo da calha. Baque duro. Baque leve.

As crianças em festa, felizes por terem sua bola. Desaparecem, sem agradecer.

Jesus no chão, na corrente, com sangue de outro.

Ouro. Havia uma regra de ouro.

Não se pode mudar. Nunca.