quinta-feira, 24 de junho de 2010

Roupa Limpa

Às vezes esquecia dos dias atrás de dois dias passados. O cheiro do alvejante da lavanderia. Perfume barato, igual a todo perfume de alvejante de lavanderia. Ficava nas roupas, entrava pelo nariz, chegava até seus sonhos.


Sonhos de tempos passados, de outras épocas. Havia visões, cheiros, luzes. Cheiro de umas flores que sempre se saíam nas redondezas donde morava. A vista do terraço. As luzes das sirenes que passavam pela rua. O cheiro de sangue meio seco.


Havia uma mulher, naqueles dias. Passava tempos sem lembrar dela. Mas alguma coisa de vez em quando a trazia para junto de si. Um cartaz, um perfume barato, uma pedra meio torta mal colocada na calçada.


Roupa gira na máquina. Sentou-se, pegou uma revista de meses atrás, largada por algum cliente de meses atrás.


Tudo vira plástico quando se mora só. As cadeiras, os copos, a comida. Tudo descartável.

Lembrava do dia que ela descartou suas coisas. Chegou na casa e lá estavam elas, na lata de lixo. A porta aberta, o quarto vazio. Levou as roupas, as flores, a mesa, a vida. No meio da sala, uma sombra perdida.

Uma arma. Sua arma.

Tudo que restou.



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